Prezados,
como está praticamente impossível de postar mais matérias de História da Arte, começarei a postar alguns artigos sobre materiais educativos que venho escrevendo.
Espero que gostem.
Att.
Juli Rossi
(artigo aprovado no V SIICA - Univille em 2011)
ANÁLISE DE MATERIAIS EDUCATIVOS INTERNACIONAIS:
UMA INVESTIGAÇÃO CONCEITUAL E METODOLÓGICA
Juliana Rossi
Alena Marmo
Este artigo relata e identifica as concepções conceituais e metodológicas presentes em materiais educativos internacionais estudados no projeto de pesquisa intitulado “Materiais Educativos de Arte: uma investigação conceitual e metodológica”. Trata-se da continuação da pesquisa “Materiais Artísticos Pedagógicos: uma investigação conceitual e metodológica” desenvolvida durante o ano de 2010 que consistiu na investigação e análise de materiais educativos vinculados ou não a exposições de arte, elaborados e produzidos por instituições culturais, tais como Fundações, Museus, Institutos, etc. O título do projeto dessa pesquisa teve o termo “pedagógico” substituído por “educativo” em 2011, pois o termo “pedagógico” causa a impressão de tratar-se de atividades prontas, como uma fórmula, enquanto “educativo” pressupõe a construção do conhecimento. Alguns materiais educativos produzidos a partir de 2005 utilizam este termo, como por exemplo, o material do museu Lasar Segall.
Durante a realização da pesquisa, em 2010, foram adquiridos novos materiais com novos formatos. Desses novos formatos, é possível constatar CDs, jogos, materiais inclusivos (cegos e socioculturais), virtuais (websites) e principalmente internacionais. Pela grande gama de materiais internacionais obtidos, fez-se necessário um aprofundamento das análises e necessidade de ampliação do foco, pois entende-se que muitos dos materiais internacionais possuem uma concepção educativa de apresentação diferente dos materiais nacionais.
Tal investigação servirá de fundamento para a elaboração da estrutura metodológica de um novo material educativo a ser construído a partir de imagens de arte brasileira do banco de imagens do Programa Institucional de Extensão Arte na Escola da UNIVILLE. Esse novo material que será construído proporcionará a construção de conhecimento em arte independente de exposições, subsidiando o professor com propostas educativas para a construção de suas aulas.
As instituições internacionais das quais, até o momento, 120 materiais educativos foram adquiridos são: Museum of Contemporary Art (Sidney – Austrália), Metropolitan Museum of Art (New York – E.U.A.), Tate Gallery (Londres, St. Yves e Liverpool – Inglaterra), The Art Institute of Chicago (Chicago – E.U.A.) e Van Gogh Museum (Amsterdam – Holanda).
Seguindo a metodologia desenvolvida na pesquisa anterior, as especificidades de cada material foram separadas em: dependentes, independentes e mistos. Os materiais dependentes são aqueles que são dependentes de exposições; é um material totalmente atrelado à visitação da mostra e complementa a visita. Os materiais independentes são materiais que não foram produzidos a partir de mostra ou acervo, mas de um recorte de arte particular. Já os materiais mistos, são aqueles que podem ser trabalhados tanto em sala de aula quanto também em visita à exposição, visa a experência estética in loco e a continuidade do estudo no espaço escolar.
Os materiais nacionais possuem, dentro desses três grupos pontuados anteriormente, mais dois formatos que não foram encontrados, até o momento, nos materiais internacionais: o inclusivo e o registro de processo de ensino-aprendizagem. Os inclusivos, dentre os quais estão alguns da Pinacoteca do Estado de São Paulo, possuem reproduções fotográficas das esculturas do seu acervo, cujas linhas de contorno de sua forma estão em braille, possibilitando o acesso ao aluno cego.
É notória a necessidade de um material educativo acessível e de qualidade aos professores de arte, tendo em vista também suas dificuldades financeiras. Sem imagem, não há aula de arte. Um bom tamanho para uma imagem de arte é, no mínimo, A3 (29,7 x 42,0cm), porém, uma impressão de folha colorida nesse tamanho (em papel couché, para que seja um material mais duro e que dure mais) custa em média R$ 5,00 em gráficas especializadas. Durante uma aula de arte em que, por exemplo, são necessárias em média, 5 imagens, o investimento será de R$ 25,00 por aula, o que se torna inviável, tendo em vista que a hora/aula do professor com formação superior, custa, em média, R$ 8,50. Na maioria das vezes a escola na qual o professor leciona não tem condições de arcar com o investimento em imagens. Há também o conceito equivocado de que o professor de arte necessita apenas trabalhar com material artístico e atividades manuais que, muitas vezes, são produzidos para decorar a escola.
Essa dificuldade é contínua, mesmo que o ensino da arte se tornou obrigatório por lei através da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN nº 9.394), em 20 de dezembro de 1996, pois nos anos 90
Conseguir imagens para utilizar na sala de aula era uma façanha. Podia-se fazer xerox coloridas de reproduções de obras de arte (mas o custo alto inviabilizava a xerox de muitas imagens) ou usar imagens de calendários ou jornais trazidos pelos alunos. Algumas imagens podiam ser encontradas em livros didáticos de Artes, porém pequenas e de má qualidade gráfica (FABRO, 2007, pg. 15).
Com a expansão, acesso e facilidade de uso da internet, assim como a popularidade do Google, é possível encontrarmos imagens de alta qualidade e até fazer visitas a museus, de forma virtual[i]. Porém, para visualizar e mostrar essas imagens em sala de aula para os alunos, é necessário um aparato tecnológico, como o data-show, computadores e softwares que, infelizmente, a maioria de nossas escolas públicas carecem ou, quando possuem, há uma disputa entre todos os professores da escola, pois normalmente a escola dispõe de apenas um equipamento.
Pela grande quantidade de escolas e professores de arte no Brasil, em muitas regiões faltam projetos, ideias e iniciativas para estimular a produção de materiais educativos. Também é perceptível no Brasil o fato de que algumas instituições e museus estão primando pela qualidade dos materiais educativos, como: Arte na Escola, Museu Lasar Segall, Oscar Niemeyer, Laboratório Inhotim. Alguns destes materiais foram produzidos com incentivo do governo de suas cidades ou até do país. Porém, em algumas cidades, há editais de cultura, como é o caso do SIMDEC (o Sistema Municipal de Desenvolvimento pela Cultura foi implantado pela Fundação Cultural de Joinville em 2006) em Joinville – SC. Cabe então a interessados e instituições de fazer o seu projeto e se inscrever para obter recursos para a produção de materiais educativos.
Nos materiais internacionais, os incentivos vêm de doações de famílias e/ou a própria instituição possui uma verba destinada à confecção dos materiais, como é o caso da Tate Gallery.
Este material educativo, o qual se intitula Modern Tate (2001), da Tate Gallery de Londres, constitui-se por dois cadernos e 24 cartões.
O primeiro caderno, Background, contém informações da história da coleção. O segundo, Action, contém atividades e estratégias para ensinar dentro da Galeria, e uma seção sobre crítica e contexto. Os 24 cartões, denominados Key Word Cards, nos quais são estudados e analisados individualmente alguns trabalhos escolhidos da coleção, apresentam ao professor sugestões para discussão dentro da galeria. Assim, o objetivo do material da Tate Gallery é o de promover tarefas para estimular a aprendizagem e o ensino de arte na galeria. Oferece atividades que podem ser adaptadas de acordo com as necessidades do grupo e foco da visita. Os conteúdos presentes no caderno educativo abordam alguns movimentos da História geral e da Arte, como: Modernismo, Pós-modernismo, Semiótica. Este material educativo internacional pode relacionar-se com a Abordagem Triangular de BARBOSA (2005), pois no caderno é possível encontrar imagens, atividades práticas sugeridas para o professor trabalhar com os alunos e noções de temas advindos da história geral, da arte, e crítica de arte.
Já em outros materiais internacionais analisados, foi possível perceber uma concepção metodológica relacionada com um sistema de crítica artística denominado Image Watching, de Robert Ott, e da Fenomenologia da Percepção, de Merleau Ponty (1999). Outros materiais caracterizam-se por possuir uma abordagem construída à partir de elementos extraídos das próprias obras que compõem o acervo da instituição e dão sugestões de atividades para o professor trabalhar independente de exposições.
Outro material educativo internacional analisado constitui-se de um material impresso em papel couché, com um tamanho um pouco menor que uma folha A4. Denomina-se Sketch (obtido do Museum of Contemporary Art de Sidney, Australia). Por ser disposto em forma de folder, é possível abrir o material, como se fosse um jornal/revista. É impresso no decorrer das exposições (está em sua 3ª edição).
Esse jornal de atividades foi criado com o intuito de a criança fazer as atividades e guardar como registro de visita de exposição. O objetivo é o de a criança poder utilizar a criatividade para responder às questões e também desenhar e usar a imaginação. Possui várias questões reflexivas e práticas e é destinado à crianças de 5 a 12 anos.
O objetivo deste material educativo não se restringe à observação da imagem. Propõe exercícios e reflexões acerca das obras que compõem essa exposição, tanto que apenas algumas são citadas e desenhadas em forma de ilustração, e não em sua forma original. Ao contrário do material da Tate Modern, não há imagens reais da exposição, mas há desenhos ao longo do caderno educativo.
As únicas informações do artista estão dispostas em forma resumida no caderno, como: cidade de nascimento e materiais que ele se apropria para fazer suas obras. Assim, pode-se entender como o propósito do material o de se trabalhar didaticamente com suas obras. Porém, anexado junto à esse pequeno jornal há também um folder do mesmo tamanho que aborda alguns dados da biografia do artista e algumas obras que constituem a exposição, além de contextualização das mesmas. Dessa forma, entende-se que esse caderno complementar serve para que o professor se inteire acerca do artista e suas produção, antes de abordá-los em sua aula ou de levar os alunos à exposição. O jornal é dependente de exposição e pensado para o educando. Este jornal, feito em 2008, tem sua abordagem muito parecida com o material educativo do Museu Van Gogh (Amsterdam – Holanda), pois há diversas atividades práticas, além de jogos, como: caça-palavras, locais de recorte, locais para desenhar e jogos para ligar as palavras. Todos esses jogos são relacionados à obras que estão na exposição, características presentes tanto no jornal Sketch quanto também o material do Museu Van Gogh.
Denominado Treasure Hunt (Caça ao Tesouro. Foto 2), produzido em 2010, o material educativo do Museu Van Gogh é dependente de exposição e foi pensado para o educando.
De forma lúdica e em tom de brincadeira, o objetivo do caderno de atividades é propor exercícios e reflexões acerca das obras do Museu Van Gogh – além de citar curiosidades sobre a vida do artista, em forma de personagens que conversam entre si.
O caderno foi feito para ser levado junto à visita da exposição, como se fosse uma caça ao tesouro, que seria a “caça” a determinadas pinturas. Informa que no balcão de informações é possível checar as respostas do caderno para ter uma surpresa (que pode ser um presente para os educandos). Foi criado com o intuito de propor uma ludicidade na visita da criança ao Museu Van Gogh. O objetivo é o de a criança poder utilizar a criatividade para responder às questões, desenhar e usar a imaginação por possuir várias questões reflexivas e práticas. A forma com que as figuras e as perguntas estão dispostas estão em um layout bem formulado, com cores vibrantes como o laranja e azul.
Esta é uma ótima forma de chamar a atenção do educando para o material educativo, pois respeita os interesses da qual provavelmente a faixa etária dos 7 aos 14 anos destina-se, como traços de história em quadrinhos e jogos como caça-palavras.
Em geral, outros materiais, como os do Metropolitan Museum of Art, por serem destinado à professores, são mais densos, a exemplo do Tate Gallery, já citado neste artigo. Como exemplo, podemos tomar o material educativo da exposição The Art of Ancient Egypt – A Resource for Educators (A Arte do Egito Antigo – Um Recurso para os Educadores) é um material que pode ser utilizado tanto em sala de aula como também dentro do espaço de exposição. Ou seja, configura-se como um material misto. Possui 184 páginas em preto e branco e é possível fazer seu download pelo site do museu. Este material contém informações sobre Arte Egípcia antiga e discute o seu papel principal nessa civilização, além de estimular a curiosidade, desenvolver a observação e desenvolver um desejo de visitar o museu para ver exemplos reais de arte egípcia. Especifica que os professores podem adaptar as propostas para estudantes de qualquer idade. Há um material visual e escrito para enriquecer estudos sociais e artísticos e linguagens de arte para fazer conexões interdisciplinares.
Os objetivos do estudo desse material educativo sobre a arte egípcia, segundo o que cita o próprio material, são os de: comunicar através de uma linguagem visual de símbolos e convenções artísticas que foram entendidas por todos os egípcios antigos; sentir-se confortável para falar sobre arte; entender que em uma obra de arte de sucesso são importantes o conteúdo, a forma e os materiais dos quais é feito a obra; ser estimulado para ir à uma visita de museu. Sendo assim, ele pode ser caracterizado como material misto. O interessante neste material é o patrocínio que recebeu, através de generosa doação da família Rose. É comum observar em alguns materiais educativos internacionais a doação que algumas famílias fazem para que seja possível a confecção destes materiais educativos internacionais.
Como afirma Fabro (2007, p. 6),
Os materiais são fundamentais como instrumentos na ação do professor, mas a fome maior destes é por oportunidades para compartilhar idéias, contato com seus pares e assim poder tatuar na sua “pele pedagógica” experiências significativas com a arte que possibilite a ampliação do seu universo cultural e de seus alunos.
A partir da investigação e análise dos materiais internacionais e também nacionais, será facilitada a constituição do material educativo de arte brasileira por meio de um recorte das imagens do banco de imagens do Programa Institucional de Extensão Arte na Escola da UNIVILLE, fazendo assim com que os professores de arte possam ter acesso facilitado à materiais educativos de arte brasileira, para que sua docência possa ser feita com mais qualidade, ao mesmo tempo em que a fruição com a obra de arte original não seja substituída, pois é de relevante importância que o aluno obtenha contato direto com a obra de arte original.
REFERÊNCIAS
APONTAMENTOS – ensino da arte contemporânea – CD-ROM – Campo Grande: Pólo Arte na Escola – UFMS.
ARTIOLI, Ana Cláudia Moraes Moreira; MARMO, Alena Rizi. Materiais pedagógicos: sua importância como recurso para o professor de arte. Seminário de Iniciação Científica da Univille. Joinville: Editora Univille, 2010.
BARBOSA, Ana Mae. Arte-educação: Leitura no subsolo. São Paulo: Cortez, 2005.
CHARMAN, Helen; GILLIAN, Wilson. Modern Tate. London: Tate, 2001.
FABRO, Maria de Lourdes Sousa. Em foco: professores de Artes e suas experiências com os materiais educativos Lá Vai Maria, Bem-vindo, professor! e Arte.br. 2007. 213 f. Monografia (Mestrado em Artes Visuais) – Universidade Estadual Paulista, São Paulo.
GRINSPUM, Denise; MOURÃO, Luciana A. Material Didático Museu Lasar Segall – Área de Ação Educativa. São Paulo: Museu Lasar Segall- IPHAN/MinC, 2005.
GRUBERGER, Rosane; MELLO, Janaina. Desvio para o vermelho – Cildo Meireles – livro de colorir e montar. Brumadinho: Inhotim, s.d.
LDBEN nº 9.394. Brasília, dez. 1996. Disponível em: . Acesso em: 25 jul. 2011.
MELO, Janaina et al. Descentralizando o acesso: caderno educativo 1 e 2. Brumadinho, MG: Instituto Cultural Inhotim, 2010.
MERLEAU-PONTY, Merleau. Fenomenologia da percepção. 2ª edição. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
OHTAKE, Ricardo et. al. Caderno do olhar Oscar Niemeyer – Ação educativa do Instituto Tomie Ohtake. Belo Horizonte: Museu de Arte da Pampulha, 2007.
PRATES, Valquiria. Traços e passos: um passeio pela obra de Lasar Segall. São Paulo: Museu Lasar Segall- IPHAN/MinC, 2007
SKETCH – Activity Journals for Kids by Contemporary Artists For 5 to 12 years olds – Tim Hawkinson: Mapping the Marvellous. Sidney: Museum of Comtemporary Art, 2008.
SOUSA, Jean et. al. Looking at art together: A Parent guide and Process Catalogue. Chicago: Art Institute of Chicago, 2002.
TOJAL, Amanda P. F. Pinacoteca do estado de são Paulo: esculturas selecionadas do acervo. São Paulo: Pinacoteca do Estado, 2009
Treasure Hunt. Van Gogh Museum. Holanda: S.n., 2010.
WATTS, Edith. The Art of Ancient Egypt: A Resource for Educators. The Metropolitan Museum of Art, s.n.: s.d.
[i] Por meio do projeto Google Art Project, em que é possível, em 1ª pessoa, andar dentro dos museus virtualmente.
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